Antes da inauguração do clube, fato acontecido em 15 de novembro de 1959, as festas dançantes de Paramirim aconteciam nos lares ou nos improvisados salões da avenida 16 de setembro, dentre eles, o Cine Aliança, o bar de Melé com meia dúzia de portas abertas pra rua e as espaçosas salas do Grupo Escolar professor José Cândido Vieira, usadas por algum tempo para os bailes de carnaval. Dançar ou sapatear ao ar livre, nas praças ou nos largos, é uma novidade dos anos oitenta para cá. Dessa distante fase, restam pouquíssimos retalhos, distribuídos em lembranças que vão se desfazendo com o tempo como o tropel de uma caravana que passa e se perde à distância.
Mesmo assim, ainda me recordo do conjunto musical Ases do Ritmo, o pioneiro de Paramirim, criado pela louvável iniciativa de um grupo de saudosistas predestinados a animar os eventos festivos.de uma cidade que sempre valorizou a música e a dança como expoentes de sua cultura. Como e quando nasceu esse conjunto, não se sabe. Digamos, numa tarde-noite quando alguns amigos se uniram para juntos expressar espontaneamente as suas alegrias, como nasce na mais das vezes as grandes ideias. Se não partiu do nada, também não teve grandes aparatos. A força de vontade e a vocação prevaleceram. Reunir uma percussão, um cavaco banjo, clarinete e mais alguns acessórios na trilha sonora de um samba ou de um bolero, foi o grande começo. Daí para frente tudo aconteceu como deveria de fato acontecer.
O conjunto Ases do ritmo foi contemporâneo da vitrola à corda, dos longs playings de 45 rpm, do cigarro continental sem filtro e da brilhantina glostora. Integrou a época do isqueiro zilto, do sapato vulcabras 752, do terno e da gravata nas festas sócias. Foi do tempo da rádio Mairink Veiga, do jeep da Wyllis, da geladeira à querosene e da bicicleta monark. Do tempo em que não havia descartáveis nem perecíveis. A durabilidade das produtos, fossem eles nacionais ou importados, tornavam os gastos menos repetitivos e mais econômicos. A sua concepção era valer-se do que se dispunha ou do que era possível para proporcionar o mínimo de alegria e diversão através da música e da dança aos diletos conterrâneos nos momentos de lazer.
No seu tempo, o Império da ostentação ainda estava por vir. Os instrumentos musicais, muitos deles confeccionados artesanalmente, eram mais simples e menos hilariantes. Nos fandangos da roça predominava a sanfona 8 baixos, o pandeiro o reco-reco e o violão. Dançava-se nos terreiros de chão batido o xote, a rancheira, o limpa banco e o baião. O bolero era uma dança granfina reservada mais para a cidade. Questão de gosto e tradição. Embalados na simplicidade e na magia de tudo isso, preservava-se o novo, o velho e o antigo. O moderno quase não existia. Nas noites de dezembro e janeiro os ternos de reisados com seus repiques de caixas esquentavam a moçada com o samba de roda madrugada a dentro com umbigadas e saracoteios.
Outro contemporâneo da orquestra Ases do Ritmo no campo das comunicações foi o serviço de alto falante A Voz da Democracia, mantido pelo Partido Social Democrático (PSD) no encontro das décadas de 50 e 60. Instalado em frente ao jardim da Praça Santo Antônio, este veículo, ao cair da noite, levava diariamente ao ar os números musicais mais conhecidos da época, através de uma singela boca de alto falante tipo corneta enchendo a cidade de alegria e ruídos ao mesmo tempo. O nome dos interpretes e compositores eram anunciados de forma bem compassada facilitando aos ouvintes conhecerem a autoria de cada sucesso, inclusive a gravadora
Por conta disso, muitos acabavam decorando os anúncios e o sotaque dos locutores. Tipo assim: ” Ouviremos agora na interpretação de Nelson Gonçalves, da autoria de Adelino Moreira, o Samba Canção. A volta do boêmio, dedicado a todos os ouvintes desse programa”.
Foi assim que no carnaval do finalzinho dos anos cinquenta, um grupo de foliões liderados pelo Sr. José Barbosa Leão (Zé Leão) deixa para a posteridade a imagem de um raro momento pela qual podemos contar um pouco da história de uma orquestra que marcou o começo dos grandes eventos na terra do rio pequeno. Não fosse o poder de uma simples fotografia, resgatada no tempo, pouca coisa ou quase nada teríamos para mostrar e registrar sobre o assunto. Por conta disso, até que se prove em contrário, nada nos impede dizer que o grupo musical Ases do Ritmo, ou seja os campeões do Ritmo, foi o primeiro conjunto musical de Paramirim, como bem prova a foto de seus protagonistas, aqui mencionada como testemunho fiel de sua existência.
Cabe-nos dizer que o Ases do Ritmo (grafado com z) como se acha escrito na referida fotografia teve no seu plantel a marcante participação de Edgard Viana (no sopro do clarinete), o mais velho do grupo, também tocava bandolim. Grande animador dos leilões de Santo Antônio. João do Trombone sabia distinguir de ouvido as notas musicais e os descompassos dos demais componentes do grupo. Um pouco escondidinho na foto aparece Zé Brasil, dono da bateria, bem na frente à direita Tota de Ana Amélia, o ás do pandeiro e à esquerda Arlindo de Estela no agogô, ou coisa parecida. No microfone Pedro Moreno, um pirralho que se enveredou no tempo, revelando-se mais tarde um grande cantor de serestas. O destaque maior ficava, entretanto, por conta de Zé Meira e a magia do seu cavaquinho, nesse tempo já eletrificado.Com esses craques, o Ases do Ritmo ou do Jazz como era mais conhecido, escreveu a sua história, teve a sua vigência e as suas glórias, sendo substituído mais tarde pelo Os atuais, mais moderno e bem mais aparelhado, também dirigido por Zé Leão.
Paramirim, 27 de fevereiro de 2021
Prof. Domingos
Fonte: Facebook de Domingos Belarmino.